Capítulo 16

    -O que está fazendo aqui?Sua suspenção ainda não acabou, que eu saiba. - disse para ele, recuperando a calma.
    -Posso estar suspenso, e por sua causa, aliás, mas nada me impede de vir falar com os meus amigos, impede?
    -Acho melhor você sair de perto da minha irmã, e acho melhor ser agora. - Gabriel vinha em nossa direção, já preparando os punhos.
    -É melhor você sair daqui . - Marcelo estava atrás de mim, com uma mão na minha cintura.
    -Pelo jeito a idiota da vez é você,amor. - Gustavo desviou o olhar para Marcelo, com um sorrisinho detestável no rosto - Você é um coitado, cara.Pegar os meus restos é muita maldade.
    -Você está pedindo outra surra, não é, seu otário? - Gabriel estava ficando cada vez mais irritado.
    -O único "coitado" daqui é você.Não preciso usar os seus métodos pra ter uma garota perto de mim. - Marcelo parecia muito irritado também.A coisa estava ficando fora de controle.
    -Realmente, você não precisa dos meus métodos.Já tem os seus, não é? E tenho certeza que, comparando com os seus, os meus são fichinha.
    Marcelo e meu irmão precipitaram-se para frente, prontos pra atacar Gustavo, mas eu segurei o braço de Marcelo, e Andressa e Sam seguraram Gabriel.Gustavo estava brincando com fogo, e era óbvio que estava gostando daquilo.Eu precisava parar aquela situação antes que as coisas esquentassem.
    -Gustavo, faça um favor a si mesmo e vá embora daqui. - eu disse - Se você não for agora, ou você vai levar uma surra, outra vez, ou eu vou ser obrigada a chamar a coordenação.
    -Preocupada comigo, amor? Assim eu me apaixono.
    -Quero que você suma e me deixe em paz.
    -Foi você que esbarrou em mim.Não tenho culpa.
    -Saia daqui logo, Gustavo.Você pode parecer, mas não é tão burro a ponto de querer mais confusão. - Andressa disse, ainda segurando meu irmão.
    -Sem problema, já estávamos indo, por isso não precisam implorar.Mas você ainda vai me ver muito, amorzinho.E uma dica: entre eu e ele, - Gustavo apontou para Marcelo - o maior babaca não sou eu.Me procure quando ele mostrar quem é.Estarei esperando.
    Marcelo trincou os dentes e estava com uma fúria incontrolável nos olhos.Estava tremendo tanto de raiva que, se eu não tivesse apertado seu braço mais ainda, com certeza mataria Gustavo ali mesmo.Minha irmã e Sam tiveram o mesmo trabalho que eu, se não mais, pois Gabriel tentava se soltar delas.Seguramos os meninos enquanto Gustavo e seu grupo saíam do nosso caminho, indo em direção à quadra poliesportiva da escola.Soltei Marcelo quando eles estavam longe o suficiente, e este foi até meus irmãos e meus amigos.Fiquei encarando as costas de Gustavo por mais um tempo, tentando descobrir por que ele gostava tanto de me atormentar.De repente, ele virou e me olhou, sério demais para ser um deboche.Seus amigos continuaram adando, mas ele ficou imóvel.Ele queria me dizer alguma coisa, mas o que? Antes que eu pudesse decifrar, ele virou de novo e alcançou seus amigos.Eu podia ter ficado com medo naquela situação anterior com o Gustavo, mas só aquele olhar me deixou muito mais apreensiva.O que será que ele quis me dizer?
    -Mari? - uma voz me chamou,me tirando daquele transe.
    -Desculpa, o que? Não ouvi.
    -Perguntei se você está bem. - Gabriel disse, com uma expressão preocupada no rosto.
    -Ah, claro, estou sim.
    -Tem certeza? Você parece meio assustada. - Luisa, assim como os demais,compartilhava da expressão da Gabriel.
    -Estou bem.Só fiquei um pouco surpresa de vê-lo aqui.Mas agora está tudo tranquilo, não se preocupem.
    -Tudo bem, então vamos? Ainda quero meu sorvete. - Sam disse.
    -Você só pensa no sorvete, não é.De amiga você não tem nada. - Leo disse, meio rindo.
    -Sou uma ótima amiga, mas enquanto nós estamos aqui eu gasto calorias e meu sorvete derrete.Vamos logo. - Sam protestou.
    -Tudo bem, vamos. - Gabriel passou o braço pela cintura da minha irmã e, junto com ela, seguiu Sam pelo estacionamento. 
    Lu e Leo estavam discutindo sobre alguma coisa que eu não tinha conseguido descobrir o que era enquanto seguiam os outros.Olhe para Marcelo, e ele estava sério.Estava com o olhar distante,pensando em alguma coisa além do meu conhecimento.
    -Tudo bem?Você está sério. - abracei sua cintura e olhei para seu rosto.Ele olhou um pouco para baixo, para me encarar, e recuperou o brilho nos olhos.
    -Sim, tudo bem, só estava pensando em umas coisas.Vamos indo antes que eles nos deixem pra trás. - ele sorriu para mim.
    Nos abraçamos e alcançamos os outros.Marcelo me deu um beijo enquanto íamos para a sorveteria e, quando paramos, sorrimos juntos.
    -Vocês ainda vão me fazer vomitar. - Luisa falou.
    Rimos dela e seguimos até o pequeno prédio laranja a duas quadras da escola.Com todas as risadas e deboches, tinha até esquecido do que havia acontecido no pouco tempo que passou.Mas a única coisa que não consegui esquecer, foi aquele olhar do Gustavo.
 
***
 
    A ICE&CREAM era a sorveteria mais popular de toda aquela parte da cidade.As paredes coloridas davam vida ao lugar, e o bufê quilométrico de sorvetes e milkshakes, obviamente, dava o sabor.Por sorte, o lugar estava quase vazio quando chegamos.Geralmente, os três andares de mesas para clientes estavam cheios.Passamos por todos os tipos de sorvetes imaginários, nos servimos, pagamos e fomos para o terceiro andar, que era o que eu e meus irmãos íamos quando podíamos nos dar ao luxo de tomar sorvete ali.Pegamos uma mesa perto da janela e todos sentamos.Andressa, Luisa e Sam sentaram em um lado, eu, Gabriel e Marcelo sentamos no outro e Leo sentou na ponta.
    Em um determinado momento, enquanto eu estava encostada na parede terminando meu sorvete e todos conversavam, riam e se sujavam, Marcelo chamou minha atenção.
    -Podemos conversar em outra mesa? Não quero que eles ouçam. - ele sussurou no meu ouvido.
    Concordei com a cabeça, saímos da mesa e fomos até o segundo andar.Sentamos em uma mesa do canto, onde ninguém nos veria.
    -O que foi? - perguntei, meio apreensiva.
    -Aquilo que o Gustavo falou.Você não levou a sério, levou?
    -O que? Sobre você mostrar que é?
    -Isso mesmo.
    -Acho que você já está me mostrando quem é, e é um cara maravilhoso.
    -Que ótimo. - ele respirou aliviado - Achei que você tivesse levado a sério.Ele é um babaca, e me arrependo de ter sido amigo dele.
    -Vocês eram amigos?
    -Sim.Quando eu estava na sexta série, ele estava na sétima, e nossos pais eram amigos.Brincávamos juntos sempre.Éramos quase irmãos, na verdade.Fizemos algumas merdas juntos, sim, mas, quando a coisa começou a engrossar, eu me afastei dele e do nosso antigo grupo de amigos.Não quis mais participar daquilo.
    -Daquilo o que?
    -Das apostas.
    -Apostas? Que tipo de apostas?
    -Do tipo que ele faz com os amigos agora.Apostávamos com quantas garotas ficaríamos até certo tempo, e quem ganhasse recebia uma quantia dos outros.Nós éramos invictos.Mas quando eles começaram a forçar as garotas, saí daquilo tudo.Não quero que pense que eu ainda sou daquele jeito.Eu não sou, ta legal?Sou desse jeito que você está vendo agora.
    Demorei um pouco pra processar aquilo tudo.Marcelo e Gustavo eram amigos, quase irmãos, e Marcelo fazia parte daquelas apostas.Era um choque e tanto, mas, olhando nos olhos dele, eu percebia que ele estava falando a verdade.Ele não era mais aquele Marcelo de antes.
    -Não se preocupe.Acredito em você. - peguei sua mão e sorri para ele.
    -Então prometa que, nao importa a merda que eu faça, e sei que vou fazer alguma merda que vai deixar você furiosa comigo, mesmo que seja a última coisa que eu queira, você não vai me deixar.
    -Prometo. - disse olhando nos olhos dele.
    Ele sorriu, levantou da cadeira e se atravessou na mesa para me dar um beijo.Acho que nos beijamos mais do que deveríamos pois, quando paramos, o dono da sorveteria,"Seu Ricardo", como nós o chamávamos, estava ao nosso lado.
    -O amor jovem é muito bonito,admito, mas não precisam exageram, ouviram?
    -Desculpa, Seu Ricardo.Acho que exageramos um pouco mesmo. - falei, tendo a certeza que estava vermelha.
    -É, foi mal.Vamos nos comportar melhor da próxima vez.
    -Acho muito bom.Vocês, jovens.... - Seu Ricardo foi em direção ao balcão.
    -Ops. - Marcelo sorriu para mim - Acho que isso não foi muito discreto.
    -Nada discreto.Vamos subir, antes que eles pensem besteira.
    Saímos do segundo andar e voltamos para a nossa mesa original.Eles ainda estavam rindo com alguma coisa e se jogando M&M's dos seus sorvetes.
    -Até que enfim voltaram. - Sam falou.
    -Estavam fazendo o que? - Luisa perguntou.
    -Cara, você é meu melhor amigo, mas eu ainda vou te quebrar se você ficar sozinho com a minha irmã desse jeito. - Gabriel disse.
    -Para de ser retardadado, Gabriel.Deixa eles namorarem em paz. - Andressa falou.
    -Não estávamos fazendo nada. - eu disse enquanto sentava.
    -Sei, e eu sou o presidente dos Estados Unidos. - Leo disse, digitando algo no celular.
    -Ele está falando com o Samuel. - Luisa disse sorrindo.
    -Estou mesmo, e daí? - Leo falou, sem olhar para nós.
    -Peraí, Leo, você é...? - Gabriel perguntou.
    -Sim, eu sou. - Leo disse sem nenhuma vergonha.Ele estava evoluindo.
    -Que massa, eu sempre quis ter um amigo gay. - meu irmão disse, dando um soco no braço do Leo.
    -Vou considerar isso um elogio. - Leo olhou para meu irmão com uma cara confusa.
    -Daqui a pouco vamos ter outro casal definitivo além da Mari e do Marcelo. - Luisa disse.
    -Cala boca, Luisa. - Leo disse.
    -E nós não somos um casal definitivo. - eu disse.
    -AINDA não somos. - Marcelo me puxou para perto dele.
    -Uh, estou enganada ou isso foi uma promessa de namoro? - Sam disse.
    -Isso FOI uma promessa de namoro. - Andressa me olhava com um sorrisinho malicioso.
    -E ninguém pede minha autorização aqui? - meu irmão disse.
    -Fica quieto, Gabriel. - Todas nós falamos.
    -Fala sério. - ele escorregou na cadeira.
    Ficamos mais um tempo na sorveteria conversando e depois voltamos à escola para buscar os carros.Me despedi de Marcelo e Sam,a qual tinha pedido carona para o irmão, e demos carona para Lu e Leo.Quando chegamos em casa, concordamos que ninguém iria jantar e fomos cada um para seu quarto fazer os deveres.Pra minha sorte, eu não tinha dever, então deitei na cama,coloquei os fones, peguei meu livro e continuei lendo de onde havia parado na outra noite.Quando percebi, já era hora de dormir.Fui até o banheiro, escovei os dentes, pus o pijama e voltei para a cama.Desliguei a luz e, depois de um tempo pensando em Marcelo, namoro e no olhar esquisito de Gustavo, adormeci.

 

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