Capítulo 14

    Acordei no outro dia totalmente destruída.Para um sábado, estava muito desanimada. Não tinha dormido nada e, quando tinha conseguido cochilar, sonhei com aquela maldita cena no teatro.Como Marcelo podia ter feito aquilo? Tudo bem que ele era só meu amigo até o momento, mas agir do jeito que agiu depois daquela semana toda já era demais.Não sabia se tinha chorado aquela noite toda de tristeza ou raiva.

    Acordei com o barulho da porta do meu quarto abrindo.Me virei, colocando o braço na frente do rosto por causa da luz, e vi a silhueta da minha irmã entrando.

    -Mari?Está acordada?

    -Agora eu estou.O que você quer? - falei virando de novo e enfiando a cabeça embaixo do travesseiro.

    -Eu soube do que aconteceu e...

    -Ah, você soube da ceninha romântica do Marcelo?Que bom.

    -Maninha, eu sei que o que ele fez foi idiota mas...

    -Não tem "mas", Dessa. - sentei na cama e olhei pra ela - Aquele garoto está me deixando louca.Ele é de um jeito em um dia e, no outro, muda totalmente.Cansei de fritar meus miolos por causa ele.Chega.Agora, se ele quiser, que venha atrás de mim.

    Meu celular começou a tocar naquele segundo.Encontrei-o entre as cobertas e olhei pra tela, assim como minha irmã.Era o Marcelo.Ele já tinha me mandado quinhentas mensagens pedindo por que não falava com ele ou por que saí correndo na sexta e tinha ligado tantas vezes que já tinha colocado meu celular no silêncioso.Já estava ficando irritada, então cancelei a chamada, não antendendo-o.

    -Não vai falar com ele? - Andressa me olhava com uma cara de pena.Ela sempre sofria mais que eu quando coisas assim aconteciam.

    -Não.

    -Mais cedo ou mais tarde vocês vão ter que conversar.

    -Por mim, vai ser bem mais tarde.

    -Não posso discordar de você.Não sei o que deu nele pra fazer algo tão idiota.

    -Se você não sabe, eu não tenho a menor ideia.

    -Tudo bem.Vou comer alguma coisa e estarei na sala se você precisar.Não se deixe abalar, tá? Garotos sempre fazem coisa idiotas.

    Ela saiu do meu quarto e fechou a porta.Pouco tempo depois, meu celular começou a tocar de novo.Dessa vez, estava decidida a atender.Peguei o celular e aceitei a ligação.

    -O que diabos você quer?

    -Eita, sei que está de mau humor, mas não precisa descontar em nós. - Luisa falou.

    -Nós? Quem é nós?

    -Você está no viva - voz comigo, com o Leo e com a Sam.

    -Oi. - os dois disseram.

    -Eai, gente.

    -Não quer vir aqui no bar perto do shopping nos encontrar?Você está precisando relaxar. - Leo disse.

    -Valeu, mas não estou afim.Vou ficar em casa.

    -Qual é, Mari. - era a Sam - Você não pode ficar assim só por causa do babaca do meu irmão.

    -Você tinha que ter ficado no teatro mais um pouco.A Sam deu o sermão do século no Marcelo. - Luisa falou.

    -Com direito a xingar a mãe. - Leo complementou.

    -Não era necessário.Não me importo mais.

    -Mariana, deixa disso.Você com certeza deve ter se enchido de chocolate na noite passada. - Sam disse.

    -E deve ter chorado muito também, porque sua voz está horrível. - era o Leo.

    -Querem fazer o favor de me deixarem ficar com raiva em paz?

    -Tudo bem. - eles responderam juntos - Mas se quiser aparecer, o convite ainda está de pé. - Luisa disse.

    -Não vou aparecer, mas obrigada.Aproveitem por mim.

    -Tchau. - eles responderam e eu desliguei.

    Deitei na cama de novo e fechei os olhos.Pouco tempo depois eu tinha dormido e acordei só na metade da tarde.Meus irmãos estavam cada um no seu quarto, então fui até a cozinha, comi alguma coisa, voltei pro quarto, pus os fones e deixei a música fluir.Não falei com mais ninguém naquele dia.

    No Domingo a noite, fui ver televisão com meus irmãos, mas não conversamos muito.Na verdade, não conversei muito com os meus irmãos durante todo o fim de semana.Quando a noite chegou, pedimos pizza, jantamos e vimos alguns filmes.Terminados os filmes, fui tomar banho, voltei pro meu quarto e li um livro que estava na minha prateleira.Fiquei lendo um pouco mais do que planejava, então quando me dei conta já estava tarde.Larguei o livro, desliguei o abajur e fui dormir, pensando no que teria que enfrentar no dia seguinte.

 

***

 

    Na terça-feira, cheguei na escola um pouco cedo, então fui até meu armário, peguei alguns livros que precisava para o dia e voltei para a parede que eu e meus amigos sempre ficávamos para esperá-los.Eles chegaram todos juntos e , quando me viram sorriram pra mim.

    -Caiu da cama hoje? - Luisa pediu.

    -Saímos de casa mais cedo hoje.Gabriel precisava abastecer. - respondi.

    -Sentimos sua falta nesse fim de semana. - Sam disse.

    -Só porque você queria que ela visse a minha humilhação. - Leo estava de cara amarrada.

    -O que foi que aconteceu? - perguntei.

    -Aquele garoto da companhia, qual era o nome dele? - Sam começou a falar.

    -Era Samuel. - Lu respondeu.

    -Então, esse aí mesmo, o Samuel, ficou trocando mensagens com o Leo  o fim de semana todo.E não sei porque você está com essa cara. - Sam olhou pro Leo - Você bem que estava gostando de responder.

    -Não enche meu saco, Samantha.Ele é só um amigo.

    -Nenhuma chance de ser mais que um amigo? - sorri pra ele.

    -Até você, Mari? - Leo ficou vermelho.

    -Confessa, você gostou dele. - Luisa cutucava Leo.

    -Talvez só um pouquinho. - Leo balbuciou.

    -EU SABIA! - Sam falou e Leo ficou mais vermelho ainda.

    -Okay, vamos deixar ele em paz. - eu disse.

    -Obrigada pela consideração. - Leo ironizou.

    Continuamos a conversar por um tempo até que, pelo canto do olho, vi Marcelo chegando.Não tinha visto ele na segunda-feira, mas na terça ele era meu colega e não tinha como escapar.Mas isso não queria dizer que eu era obrigada a falar com ele.

    Ele parou perto da porta e acenou pra mim, gesto que eu não correspondi.Naquele momento, o sinal tocou.Nos despedimos da Sam que, quando virou e viu seu irmão, fez uma cara feia pra ele e saiu andando.Entramos na sala e, quando Luisa e Leo sentaram, Marcelo sentou em uma das classes do lado.Mudei de direção e fui até o outro lado da sala sentar bem longe deles.Lu e Leo me olhavam com pena, o que eu já não estava gostando, mas o que me deixava mais irritada ainda era que Marcelo me olhava com uma cara triste.Como ele ousava pensar que tinha o direito de me olhar daquele jeito?Ele que tinha feito a burrada.

    A aula começou e, com sempre, fiquei rabiscando letras e desenhos no meu caderno.No segundo período, a professora explicou um pequeno trabalho que teríamos que fazer e entregar até o final daquela aula, e tive sorte de que era individual.De tempos em tempos, percebia Marcelo me olhando, mas fazia o maior esforço do mundo para ignorá-lo.Quando o sinal tocou para o intervalo, saí rapidamente da sala, sem que ninguém me visse, e fui até a parte de trás da escola.Meu professor de piano da cidade natal tinha me enviado algumas músicas para treinar , então me concentrei em estudá-las.Passei o intervalo todo estudando as músicas e fazendo mudanças nelas e, quando o sinal tocou novamente, peguei as folhas e fiz meu caminho de volta até a sala.

 

***

 

    A aula de sociologia tinha finalmente acabado e eu podia ir pra casa.Arrumei minhas coisas e esperei meus dois amigos arrumarem as suas também para sairmos juntos.Saindo da sala, encontramos Sam, Arthur,Gabriel e Andressa na porta.

    -Eai, gente. - Arthur disse - Que tal irmos comer alguma coisa?

    -Eu vou. - Sam disse.

    -Posso ir sem nenhum problema. - Luisa respondeu.

    -Eu também posso. - Leo falou.

    -Nós queríamos, mas temos muita coisa pra fazer hoje. - Andressa disse - Mas se você quiser ir,Mari, tudo bem.

    -Não estou afim, desculpem.Vamos pra casa? - respondi.

    -Tudo bem.Vamos. - Gabriel começou a andar, com minha irmã e eu ao seu lado.

    De repente, senti alguém segurar o meu braço.Olhei para trás, e vi Marcelo.

    -Podemos conversar?

    -Não temos o que falar. - respondi seca e voltei a andar.

    -Temos sim. - ele segurou meu braço novamente.Meus irmãos e meus amigos pararam de andar, assim como eu. - Você está muito estranha.Não respodeu minhas mensagens nem antedeu minhas ligações durante o fim de semana todo.Está me ignorando completamente e tenho certeza que está brava comigo.Quero saber o que está acontecendo,Mari.

    -Não está acontecendo nada.Posso ir pra minha casa, agora?Estou cansada.

    -Você não vai pra casa até me dar uma resposta de verdade."Não está acontecendo nada" não me convence nem um pouco,Mariana.

    Abaixei a cabeça e respirei fundo.Estava tremendo.Aquele garoto ia ouvir agora.

    -Quer uma resposta convincente? - puxei meu braço, fazendo Marcelo soltá-lo - Tudo bem então.A verdade é que estou cansada de você mexer desse jeito comigo.Um dia, você é o cara mais legal do mundo e, no outro, age como se nada tivesse acontecido.Uma novidade? eu GOSTO de você, Marcelo, mas e daí? Você não liga.Você brinca comigo como se eu fosse apenas uma boneca, ou esqueceu do que aconteceu?Um dia sou a garota mais especial que você conhece e, no outro, aprecio a sua linda ceninha com aquela garota no teatro.Cansei de fritar meus neorônios.Estou ficando louca por sua causa.O que você pretende com isso? Quando decidir o que quer, você me avisa, mas por enquanto, não quero mais isso pra mim.

    Todos estavam vendo aquela linda cena que eu estava fazendo no corredor, mas não me importava mais.Marcelo abaixou a cabeça e não disse nada.Dei as costas pra ele e voltei a andar.Sentia que todos me observavam, mas não virei até que ouvi a voz dele.

    -ACONTECE QUE EU SOU UM DIOTA QUE NÃO SABE MAIS O QUE FAZER! - Marcelo gritou.

    Parei onde estava e virei.Ele estava vindo em minha direção.Quando chegou perto o bastante começou a falar.

    -Eu sou o cara mais babaca que existe, e sei disso, mas não dá mais.Eu gostei de você desde o primeiro minuto que eu te conheci, naquele maldito carro.Já fiquei com muitas garotas, mas senti que você era diferente.No começo achei, sim, você a garota mais legal que eu já tinha conhecido mas, depois que te conheci melhor, comecei a sentir coisas que eu nunca tinha sentido na minha vida.No primeiros dias de aula, a Brenda ainda estava no meu pé, e eu saí com ela pra acabar com tudo de uma vez, como você ouviu aquele dia.Eu nunca soube o que falar na sua frente,ou o que fazer quando estava com você, e aquilo que aconteceu no alojamento foi...foi um impulso.Não queria que tivesse acontecido daquele jeito, mas aconteceu.E não vou mentir, gostei muito.Você é a garota mais linda, engraçada e carinhosa que eu já conheci e....e....EU ESTOU APAIXONADO POR VOCÊ, PORRA!NÃO AGUENTO MAIS! No dia daquela festa, não fui buscar vocês por um "mal pressentimento".A verdade é que eu estava puto da vida só em pensar que aquele babaca estava com você e podia, sei lá, fazer alguma coisa com você.Quando vi o que ele estava fazendo, fiquei louco.Poda ter matado ele se você não estivesse naquele estado.E aquela garota no teatro, eu juro que não sei o que aconteceu.Ela me agarrou e me beijou.Acho que era uma amiga da Brenda, sei lá.Quando vi você indo embora, fui atrás de você, mas você correu e não consegui te alcançar.Eu estou apaixonado por você,Mari.Eu...

    Não deixei ele terminar.Segurei seu rosto e grudei meus lábios nos dele.Ele ficou meio surpreso de início, mas logo depois correspondeu o beijo.Ouvia gritos, assobios, palmas e "uhuu"s por todos os lados.Quando nos largamos, sorri para ele.

    -Tudo bem, está desculpado.

    -Isso foi meio inesperado, mas longe de mim reclamar. - Ele sorria de um canto a outro do rosto.Nos abraçamos e ficamos ali, como se só nós dois existíssemos.

    -Quando foi que perdi a parte em que meu melhor amigo se apaixonou pela minha irmã mais nova? - Gabriel disse,olhando para Marcelo - Você vai apanhar, cara.

    Nos largamos e vimos Gabriel correndo em nossa direção.Ele sorria de um jeito brincalhão.

    -Acho melhor você correr. - eu disse, meio sorrindo, meio rindo.

    -Nao precisa falar duas vezes. - Marcelo me largou e começou a correr do meu irmão.

    -Muito bem, maninha. - Andressa veio até mim  e me abraçou - Assim que eu gosto de te ver.Feliz.

    -Ah, já que estamos nesse assunto, queria te perguntar uma coisa. - falei para minha irmã.

    -O que quiser. - ela disse.

    -Quem era a garota que estavam conversando lá em casa?Você e o Marcelo, sabe?

    -Ai, sua ingênua. - Andressa ria - Estávamos falando de VOCÊ. VOCÊ era a garota.

    -Agora que está tudo resolvido, - Sam disse - Acho que todos podemos ir comer alguma coisa.

    -Concordo totalmente. - Luisa disse.

    -Apoiado. - Leo disse também.

    -É, acho que sim.

    -Esse otário pervertido só vai quando eu der um chute nele. - Gabriel falou, ainda correndo atrás do Marcelo.

    Todos, inclusive meu irmão, minha irmã e meu atual quase-namorado, fomos até a saída da escola e depois para uma lanchonete ali perto.Beijei Marcelo inúmeras vezes, e meus amigos começaram uma guerra de batatas fritas, até que fomos expulsos do lugar.Ficamos ficamos na rua por mais tempo que o planejado, mas ninguém se importava.Era dia de comemoração.E principalmente para mim, afinal, finalmente aquele drama todo tinha terminado e eu tinha conseguido o que eu queria tanto: o Marcelo finalmente era meu, e eu era dele.